sábado, 31 de janeiro de 2009

Embora o município de Mafra tenha o 8 de setembro de 1917 como data de seu aniversário, devemos lembrar, que a data corresponde a criação do município pela Assembléia Legislativa após o término do litígio territorial entre Paraná e Santa Catarina, denominado de Contestado no ano de 1916. Já com relação a origem do povoamento, isto remonta a 1772, que segundo D. Luiz Antônio de Souza sobre o itinerário feito por um prático, da cidade de São Paulo para o Continente de Viamão relata: “[...]O rio Negro he caudalozo, tem canoas e há moradores que vendem alguns poucos gêneros”(1901, p.58).

O relato evidencia tanto o surgimento do povoamento como do comércio na região, para o qual se tem como hipótese negociarem com a pequena população local e em particular com os viajeiros, condutores de tropas de mulas e de tropas de cargueiros.

As tropas cruzaram a região por aproximadamente 200 anos, tendo a rota poucas variantes, sendo o trecho de 40 léguas da Lapa-PR a Lajes-SC um sertão habitado por índios Xokleng e Kaingang.

O trecho cruzado por tantos anos, com tantos animais, sobre o mesmo caminho, deixou no solo profundos sulcos, o que constitui hoje os vestígios da passagem dos tropeiros pela região.

O rumo desse caminho no antigo povoado de Rio Negro registrado em documentos interessantes datados do ano 1772 e em mapas antigos datados do início do século XX e nos manuscritos de Juvino Tabalipa, descreve: “De Augusta Vitória o caminho seguia para o Saltinho, daí ao Morro Grande, a Lagoa Seca e passando por Bela Vista ao Butiá, cujo ponto de pouso era na propriedade do então tropeiro e empreendedor comerciante João Braz Moreira. Do Butiá ao arroio Taquaral, daí as terras de cultura até o rio São Lourenço, passando pelo Quebradente, seguindo para o arroio dos Hau e, deste ao arroio da família Peters. Daí o caminho seguia para o arroio da família Auresvaudt, seguindo para o arroio do paço, já na cidade e, deste ao passo do rio Negro”.

Em Augusta Vitória, na cabeceira do rio Guabiroba, na propriedade da família Portela, encontra-se um caminho fundo, assim por nós denominado, com aproximadamente 1000 metros de extensão, com 1,5 metros de profundidade por 1,5 metros de largura. Nesse local os tropeiros faziam pouso. A hipótese, que se levanta para que o local da Guabiroba tenha sido escolhido como ponto de falha, para o descanso, tanto dos tropeiros quanto dos animais, está no fato da geografia da região se constituir num vale, o que possibilitava a ronda e a segurança dos animais.

Próximo a este ponto de pouso, a poucos metros do caminho, há a gruta de Santa Ermida, na linguagem da população local: Santa Emídia, que segundo eles, foi onde o Monge São João Maria, o qual andava pelo caminho das tropas, teria parado para descansar. A Lapa incrustada num paredão de pedra, com aproximadamente 6 metros de extensão, com 4 metros de largo e com cerca de 2 metros de alto, é abastecida por um riacho, que na gruta forma uma cachoeira, cuja água, para a população, é santificada. Muitos são os devotos a visitarem o local, onde está montado um altar, mantido com muitos santos e flores.

Além da gruta, há um pequeno cemitério, também mantido pelos moradores até os dias de hoje, e sobre o qual contam que: “Quando um grupo de tropeiros parou para fazer pouso, dois tropeiros brigaram por um pedaço de torresmo, e durante o entrevo sacaram os revólveres e, que na tentativa de um defender-se do outro, acabaram atirados os dois, os quais foram sepultados no local”.

A região cruzada por este antigo caminho, na época, era um sertão, “[...]mato de muito máo caminho” (documentos Interessantes, 1901, p.58).Saindo da Guabiroba, os tropeiros cruzavam por um terreno muito íngreme, então localidade de Saltinho, hoje Avencal do Saltinho, numa extensão de aproximadamente 300 metros, sendo que nesse local, encontram-se, muito bem preservados os vestígios do caminho, os quais são caminhos fundos, com mais de 1,5 metros de profundidade, com taipas construídas para evitar o desmoronamento das barrancas do caminho, os quais constituem muros de pedra, só encontrados nas regiões de Santa Cecília e Lages.

A região de Augusta Vitória e Saltinho, no interior do município de Mafra, dentre, todo o trecho do caminho que compreende de Curitibanos ao passo do rio Negro, detém em seu solo ricos vestígios do caminho e passagem dos tropeiros, os quais estão evidenciados nos caminhos fundos, e nas taipas, muito bem preservados. A hipótese para esta preservação, está no fato dos tropeiros terem cruzado por áreas que até o momento impossibilitaram a prática da agricultura e da pecuária. Além do que, muito desses vestígios encontram-se praticamente dentro de uma floresta, com geografia de relevo bastante íngreme.

Do Saltinho os tropeiros seguiam para a região da Sepultura, hoje Bela Vista. Sepultura, nome dado pelos tropeiros, pois, a região era povoada por índios Xokleng e Kaingang, os quais tinham como prática atacar e saquear os viajeiros, o que denota ter sido a região extremamente violenta, daí o nome Sepultura. Mas tarde, a população local mudou o nome para Erveira, dada a grande quantidade de Ervais existentes. E, finalmente a comunidade decidiu pelo nome de Bela Vista, o qual se mantém até os dias de hoje.

A região de Augusta Vitória a Bela Vista, constitui um rico sitio arqueológico, pois, são encontrados muitos utensílios, objetos da cultura indígena, como por exemplo: pontas de flecha, mãos-de-pilão e machadinhas feitos em pedra.

Além dos vestígios arqueológicos, há também um rico sítio paleontológico da Era Paleozóica, Período Permiano, com um tempo de aproximadamente 200 a 250 milhões de anos atrás.
De Bela Vista o caminho segue ao ponto de pouso no Butiá do Braz, no passo do rio Butiá. O nome Braz deve-se a João Braz Moreira, bisneto de Camilo da Maia Moreira, o qual tinha uma sesmaria em São Francisco do Sul. Segundo seu neto Dr. Timotheo B. Moreira Filho, o João B. Moreira, então habitante de Parati, hoje município de Araquari-SC, “resolveu aventurar, vindo para Rio Negro, onde abriu um comércio, primeiramente nos Campos de São Lourenço, mas, por problemas com os imigrantes germânicos, os quais eram a maioria dominante na região, e o João B. Moreira de origem Moura, de cor morena, cor de cuia, resolveu mudar-se para o Butiá”.

No Butiá, ainda segundo seu neto, ele abriu um comércio no ponto de passagem dos tropeiros, e fez em sua propriedade o ponto de pouso desses viajeiros. Além de ser comerciante estabelecido na região, também exercia a atividade de tropeiro, possuía vinte cargueiros, com os quais, carregados de mercadorias, tropeava até a região de Oxford em São Bento do Sul para negociar. Os produtos ele comprava tanto dos tropeiros vindos de São Paulo quanto dos tropeiros vindos do sul.

João B.Moreira [entre 1870-1930], viveu o movimento tropeiro e viu o início da concorrência com o transporte ferroviário. Mafra, então Rio Negro, no início do séc. XX, já dispunha da Estrada de Ferro, através da qual J.B.Moreira fazia o transporte de mercadorias do litoral para o planalto.

Segundo seu neto, o João B.Moreira enriqueceu no Butiá, ele se fez, tanto no aspecto econômico quanto político. A ele se deve o Cemitério, a Escola, a Igreja, e o Comércio do Butiá, que na época era o mais forte, atendia não somente a população da localidade, mas toda a população da cidade, que de carroção, ou a cavalo se deslocava para comprar no Butiá do Braz.

Os vestígios no Butiá estão manifestos nos casarios, ainda mantidos pela família. São construções todas em madeira de imbuia, assim como todas as demais construções da época. O que explica este tipo de construção era a fartura de madeira na região.

No próximo artigo vamos conhecer os vestígios no trecho entre o Butiá do Braz e o passo do rio São Lourenço e, no terceiro e último artigo vamos conhecer os vestígios no trecho entre o passo do rio São Lourenço ao passo do rio Negro. (Prof. MSc Sandro C. Moreira)

sexta-feira, 30 de janeiro de 2009

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